Mais da metade da população das dez maiores capitais do Brasil (52%) aponta que a poluição do ar é o maior problema ambiental de sua cidade. Um terço diz ser a poluição sonora, outro terço as enchentes e alagamentos e 30% a poluição de rios e mares. É o que mostra a pesquisa “Viver nas Cidades: Meio Ambiente e Mudança Climática” do Instituto Cidades Sustentáveis, realizada pelo IPEC e lançada nesta semana.
Quanto aos maiores impactos, o calor excessivo foi o mais citado com a metade das respostas, seguido por poluição do ar e preço dos alimentos. A pesquisa permitia três escolhas por entrevistada (o).
A relação causa-efeito tem papel importante para o despertar da consciência no tema ambiental. A poluição do ar, por exemplo, é consequência de fatores como as emissões de gases por veículos, sobretudo os movidos a diesel, e responsável pelas doenças respiratórias que acometem, só na cidade de São Paulo, mais da metade da população. A mudança da frota de transporte coletivo para ônibus que não utilize combustível fóssil muito contribuirá para a solução deste grave problema.
Já as enchentes têm relação com a mudança de regimes de chuvas —provocada sobretudo pelo desmatamento— que gera inundações nas cidades da região sul e seca nas da região norte, fato previsto pela ciência há mais de década e não considerado pela maioria dos gestores públicos e privados. Neste caso, a gestão de riscos ambientais pelos municípios pode reduzir em muito o sofrimento da população.
Como vemos, todos esses temas podem ser objeto de ações do poder público. Não por outro motivo, oito em cada dez entrevistados acreditam que os prefeitos e vereadores têm muito a contribuir com o enfrentamento da mudança climática. Citam que devem ajudar no controle do desmatamento, na redução do uso do combustível fóssil, na ampliação das áreas de preservação ambiental e promover a destinação adequada dos resíduos sólidos.
É sempre bom lembrar que o tema ambiental tem guarda compartilhada. No âmbito global tem relação com as metas de redução de emissões assumidas pelos 196 países que assinaram em 2015 o Acordo de Paris, que estabeleceu como limite de aquecimento do planeta dois graus celsius até o final do século (preferentemente 1,5 grau).
Passados dez anos do Acordo, já alcançamos a meta ideal de 1,5 grau estabelecida para 2100. O que reafirma que nosso modelo de desenvolvimento é muito eficiente em antecipar metas: cumpriu em 10 anos o que estava previsto para 85 anos.
O prêmio que recebemos por esta eficiência vem embalado na forma de enchentes, secas, tufões, queimadas, entre outras catástrofes. E o que chama atenção é que a maioria dos investidores e agentes financeiros segue financiando projetos e produtos que não consideram o impacto ambiental, na crença de que não serão responsabilizados pelos problemas que provocam.
O petróleo e o gás são responsáveis por 70% do aquecimento global e, caso não haja uma forte redução de sua participação na matriz energética global, não conseguiremos resolver o problema. É neste contexto que a exploração de petróleo na foz do Amazonas deve ser analisada e, por isto, além dos riscos envolvidos, será um retrocesso se aprovada.
Se no mundo o maior desafio ambiental são os combustíveis fósseis, no Brasil é o desmatamento. Por isso a importância da redução do desmatamento e da preservação da biodiversidade. Mas, lamentavelmente, na contramão de todos os compromissos e de todas as recomendações, o senado brasileiro acaba de aprovar o PL do desmatamento, também conhecido como PL da devastação, que flexibiliza regras de licenciamento ambiental, altera a proteção de territórios indígenas e quilombolas e reduz a reserva legal da Amazônia de 80% para 50%.
Neste contexto, a pesquisa pode ser encarada como um manifesto silencioso da população em relação aos desafios ambientais que temos pela frente. Ela aponta para uma aplicação do nível de consciência da sociedade com a inconteste defesa da preservação do meio ambiente, relacionando com os impactos que tem sofrido. Em ano de COP30, é uma mensagem e tanto para aqueles que têm o poder de fato para enfrentar a emergência climática.
Folha de São Paulo